Fabio Batista
No início de 1971
Foucault, Pierre Vidal-Naquet e Jean-Marie Domenach iniciaram as atividades do
Grupo de Informação sobre as Prisões (GIP), as quais duraram aproximadamente
dois anos. Para se compreender temas da década 1970 na filosofia foucaultiana,
tais como: poder, prisão, disciplina, devemos levar em consideração a ação
política do GIP? Talvez, não tenho certeza. Por quê?
Ora, se assim
procedermos, ou seja, pondo lado a lado vida e obra talvez estaremos promovendo
um modo de leitura criticado pelo próprio Foucault. Pois, de acordo com ele, na
conferência “O que é um autor?”, ao se estudar um texto há que se desconsiderar
a individualidade daquele que escreve. Não se deve ter em consideração a noção
de autor enquanto fonte originária e fecunda quando se faz a história de um
conceito ou de um tema.
Contudo,
há que se admitir, contra o próprio Foucault, que sua militância no GIP teve um
duplo impacto sobre ele (ainda que parcial). Ela parece orientar suas
pesquisas; e o ajuda na reelaboração da concepção corrente de intelectual.
O
GIP atuou junto aos presos e seus familiares, entre 1971-1972, na procura de pôr
em xeque a prisão enquanto uma instituição intolerável. E por dois anos os
cursos de Foucault no Collège de France exploraram o mesmo tema: a
prisão (Teorias e instituições penais; A sociedade punitiva); e o mesmo em
uma conferência no Brasil em 1973 na PUC-RJ (A verdade e as formas jurídicas);
e também no livro de 1975: Vigiar e punir: o nascimento da prisão. Ou
seja, pode-se observar um paralelo entre a ação política e as pesquisas
acadêmicas de Foucault. No limite um paralelo entre vida e obra.
Da atuação junto ao GIP nasceu uma nova
concepção de intelectual. Até então o intelectual era o intelectual-universal,
o qual defendia valores universais e conduzia os oprimidos e explorados à
liberdade. Lutava contra as injustiças e falava por todos aqueles que,
presumivelmente, não podiam falar. Tal intelectual era o escritor. Para
Foucault era preciso repensar esta concepção. Não mais o
intelectual-universal-escritor, mas, doravante, o
intelectual-específico-técnico. Por exemplo: de acordo com Foucault, passou-se
do escritor Zola ao físico Oppenheimer. O intelectual deveria agir de forma
local e deixar de lado a perspectiva universal. Estar junto a todos aqueles que
lutam, deixando de lado o privilégio hierárquico. E jamais, acima de tudo,
falar pelos outros. Nascia aí o intelectual específico. Pois, específicas se
tornavam as lutas; ainda que não isoladas.
Diante
disto nota-se uma forte relação entre a atuação de Foucault no GIP e sua
filosofia. Portanto, me parece plausível recorrermos a essa atuação para
compreendermos melhor temas e conceitos foucaultianos da primeira metade da
década de 1970. Ainda que tal aproximação, entre vida e obra, não seja
bem-vinda ao próprio Foucault.